ID-10092812O Acidente Vascular Cerebral (AVC), vulgarmente chamado de “derrame cerebral”, é a maior causa de mortalidade no Brasil e uma das maiores causas e morte e incapacidade no mundo.
Caracterizado pela perda rápida de função neurológica, decorrente do entupimento (isquemia) ou rompimento (hemorragia) de vasos sanguíneos cerebrais, o AVC é um evento de início súbito no qual o paciente pode apresentar paralisação ou dificuldade de movimentação dos membros de um lado do corpo, dificuldade para articulação das palavras, déficit visual súbito de uma parte do campo visual ou outros. Pode ainda evoluir com coma e outras complicações.

Trata-se de uma emergência médica que pode evoluir com sequelas ou morte, sendo a rápida chegada no hospital importante para a decisão terapêutica. No Brasil, a principal causa de morte são as doenças cardiovasculares, como o AVC, que representando cerca de 1/3 das mortes por doenças vasculares, principalmente em camadas sociais mais pobres e entre os mais idosos. É o problema neurológico mais comum em algumas partes do mundo gerando um dos mais elevados custos para as previdências sociais de diversos países.1

Dentre os principais fatores de risco para AVC estão: a idade avançada, hipertensão arterial (pressão alta), tabagismo, diabetes, colesterol elevado, Ataque Isquêmico Transitório (AIT) prévio e uma arritmia cardíaca chamada fibrilação atrial.

Fatores de risco para AVC

Existem diversos fatores considerados de risco para a chance de ter um AVC, sendo os principais a idade avançada,hipertensão arterial sistêmica (pressão alta), tabagismo, diabetes mellitus, colesterol elevado, acidente isquêmico transitório (AIT) prévio e uma arritmia cardíaca chamada fibrilação atrial, dentre outros.

Principais fatores de risco

Hipertensão arterial: Esta é uma condição de saúde muito prevalente na população a nível mundial e deve ser adequadamente acompanhada e tratada. Deve-se entender que qualquer indivíduo pode se tornar hipertenso. Que uma medida isolada não substitui o monitoramento frequente : não é porque você aferiu (mediu) sua pressão uma vez e ela estava normal, que você nunca mais tem que se preocupar com ela. Outro erro comum: interromper o tratamento porque a pressão estava normal. Ora, a pressão está bem controlada justamente porque o tratamento está sendo realizado. Geralmente, é preciso cuidar-se sempre, para que ela não suba inesperadamente. A hipertensão arterial acelera o processo de aterosclerose, além de poder levar a uma ruptura de um vaso sanguíneo ou a uma isquemia.
Doença cardíaca: Diversas doenças cardíacas podem determinar um AVC. As principais situações em que isto pode ocorrer são arritmias, infarto do miocárdio, doença de Chagas, Insuficiência Cardíaca Congestiva, Valvopatias, etc.
Tabagismo: O hábito é prejudicial à saúde em todos os aspectos, principalmente naquelas pessoas que já têm outros fatores de risco. O fumo acelera o processo de aterosclerose, diminui a oxigenação do sangue e aumenta o risco de hipertensão arterial, câncer, infarto miocárdico e AVC, dentre outros.
Consumo excessivo de bebidas alcoólicas: Leva a aumento dos níveis de colesterol, maior propensão à hipertensão arterial, dentre outros.
Diabetes: é uma doença em que o nível de açúcar (glicose) no sangue está elevado. A medida da glicose no sangue é o exame de glicemia. Se um portador desta doença tiver sua glicemia controlada, tem menor risco de AVC do que aquele que não a controla.
Idade: quanto mais idosa uma pessoa, maior a sua probabilidade de ter um AVC. Isso não significa que jovens não possam ter acidentes vasculares cerebrais, apenas é menos frequente nestes indivíduos e geralmente ocorrem na presença de fatores de risco específicos.
Sexo: até aproximadamente 50 anos de idade os homens têm maior propensão do que as mulheres; depois desta idade, o risco praticamente se iguala.
Obesidade: aumenta o risco de diabetes, de hipertensão arterial e de aterosclerose; assim, indiretamente, aumenta o risco de AVC.
Anticoncepcionais hormonais: Aumentam o risco de qualquer fenômeno trombo-embólico. Atualmente acredita-se que as pílulas com baixo teor hormonal, em mulheres que não fumam e não tenham outros fatores de risco, não aumentem, significativamente, a ocorrência de AVC.
Aneurismas intracranianos: Formações saculares que se desenvolvem nas paredes de artérias, frequentemente congênitos ou decorrentes de hipertensão arterial mal controlada. Aumentam o risco de AVC hemorrágico (vide “Classificação e fisiopatologia”).
Malformação arteriovenosa cerebral: Distúrbio congênito dos vasos sanguíneos do cérebro resultante de conexão anormal entre as artérias e as veias. Aumenta a chance de AVC hemorrágico (vide “Classificação e fisiopatologia”).

Classificação e fisiopatologia

Os acidentes vasculares do cérebro podem ser basicamente decorrentes da obstrução de uma artéria que irriga o cérebro (isquemia) ou por sangramento de algum vaso sanguíneo(ou seja, hemorrágico). Cabe ressaltar que o termo “derrame” não é apropriado, visto que em apenas uma parte dos AVCs (na verdade a minoria deles) ocorre um derramamento de sangue no tecido encefálico.

AVC isquêmico

É o tipo de AVC mais comum, presente em cerca de 80% dos casos. Ocorre pela falta de fluxo sanguíneo em determinada região do cérebro, levando ao sofrimento e morte de céulas do tecido nervoso. Essa queda no fluxo sanguíneo pode ser mais comumente decorrente de:

• Uma obstrução arterial ocasionada por um trombo ou por êmbolo, que podem ser decorrentes de placas de “gordura” (ateroma) nas paredes de artérias do pescoço ou intracranianas, bem como êmbolos de origem cardíaca;
• Queda na pressão de perfusão sanguínea, como nos estados de hipotensão, particularmente em indivíduos com ateromatose de artérias carótidas e vertebrais, cuja função é levar sangue oxigenado ao cérebro.

Nos primeiros momentos do AVC isquêmico não há morte de tecido cerebral, mas a falta de suprimento sanguíneo provoca a rápida degeneração do tecido cerebral, um tecido metabolicamente muito ativo e que demanda muito oxigênio e glicose para manter seus neurônios vivos. A área central do acidente vascular morre em pouco tempo, pois está praticamente sem nenhum fluxo de sangue. Todavia, existe uma região ao redor do infarto central que possui um fluxo de sangue reduzido, que se mantém viável por mais tempo. A essa área dá-se o nome de penumbra. É na penumbra, uma área parcialmente perfundida, mas ainda viável, que deve-se concentrar os esforços terapêuticos. É por isso também que o tempo do início do tratamento emergencial do AVC para a reversão da obstrução é crucial na evolução do paciente.

O AIT ou ataque isquêmico transitório é considerado um prenúncio de AVC isquêmico. Corresponde a uma isquemia (obstrução arterial) passageira que não chega a levar a uma lesão neurológica definitiva e não deixa sequelas. Constitui um fator de risco muito importante, visto que uma elevada porcentagem dos pacientes com AIT apresentam um AVC nos dias subsequentes.

AVC hemorrágico

É o acidente vascular cerebral menos comum presente em cerca de 20% dos casos, mas não menos grave. Ocorre pela ruptura de um vaso sanguineo intracraniano. O sangue em contato com o parênquima nervoso tem ação irritativa. Além disso, a inflamação e o efeito de massa ou pressão exercida pelo coágulo no tecido nervoso também levam à disfunção neurológica. Pode ser divido em dois tipos: o sangramento intraparênquimatoso ou a Hemorragia Subaracnóidea.

• O sangramento intraparênquimatoso ocorre frequentemente por ruptura dos “aneurismas de Charcot-Bourchard”, pequenas formações saculares das artérias cerebrais, que se formam pela hipertensão arterial descontrolada ou não tratada.
• A hemorragia subaracnóide ocorre comumente por sangramento de aneurismas cerebrais (formações saculares das artérias) no espaço onde circula o líquido céfalo-raquidiano, também chamado espaço subaracnóideo. Essas formações tem muito frequentemente origem congênita.

Diagnóstico
Sinais e sintomas

O diagnóstico do AVC é clínico, ou seja, é feito pela história e exame físico do paciente. Os principais sintomas são:
• Assimetria na face (paciente fica “com a boca torta”);
• Dificuldade em movimentar os membros de um lado do corpo;
• Dificuldade pala falar ou se expressar ou compreender o que lhes é dito;
• Alterações visuais.

Durante um exame pode-se pedir ao paciente que sorria, levante os dois braços e repita uma frase (como “trinta e três”). Observando as anormalidades citadas acima, quanto mais rápido o socorro, maiores as chances de reversão dos sintomas.

Exames diagnósticos

Os médicos recomendam que a hipótese seja confirmada por um exame de imagem, Tomografia Computadorizada ou Ressonancia Magnética, que permitem ao médico identificar a área do cérebro afetada e o tipo de AVC.

A tomografia pode ser o exame inicial de escolha por sua disponibilidade e rapidez. Serve principalmente para diferenciar o AVC por isquemia do hemorrágico, o que muda radicalmente a conduta médica. Uma tomografia normal dentro das primeiras 24 horas de um AVC isquêmico é algo esperado e confirma o diagnóstico, pois a maioria dos AVC’s isquêmicos não provoca lesões visíveis tão precoces nesse exame. Apenas lesões extensas ou mais antigas podem ser vistas de imediato na tomografia no AVC isquêmico . Nesta fase é às vezes possível identificar sinais indiretos de AVC como edema cerebral. Já o AVC hemorrágico costuma vir com imagem na tomografia indicando sangramento.

Embora mais precisa que a tomografia, a ressonância magnética é um exame demorado, que só deve ser indicado na emergência quando for necessário para determinar a realização ou não de trombólise, que é o tratamento possível de se instituir nesta fase.

Fora desta situação, não costuma mudar a conduta médica no primeiro atendimento e pode ainda atrasar o tratamento correto, o que pode ter impacto na recuperação do paciente. Portanto, deve ser reservada para casos selecionados. Em todos os demais casos, deverá ser realizada durante a internação do paciente.

Tratamento do AVC isquêmico na fase aguda

O tratamento do AVC na fase aguda consiste na administração de medicação chamada “trombolítico”, mais comumente por via endovenosa, sendo este tratamento reservado para pacientes que possam iniciar a medicação em até no máximo 4,5 horas após o início dos sintomas. Passado este prazo, há ainda possibilidade de trombólise intra-arterial, que é um procedimento mais complexo, menos frequentemente disponível nos hospitais e que só leva a benefício se realizada até 8 a 12 horas do início dos sintomas, dependendo de qual território arterial foi acometido.

O manejo da pressão arterial no AVC isquêmico é peculiar, uma vez que tanto pressões muito altas como muito baixas podem ser fatais. Ambas as situações podem apresentar um potencial de morbi-mortalidade, pois a hipertensão pode estar associada à transformação hemorrágica e recorrência do AVC, enquanto a hipotensão pode levar a uma baixa perfusão, provocando lesões definitivas da zona da penumbra isquêmica e levando a um pior prognóstico. O tratamento de redução da PA desses pacientes já foi associado a uma melhora de prognóstico e há um aumento da eficiência e segurança do tratamento trombolítico, porém apenas quando elevada acima de determinados valores.

Outros estudos correlacionam a redução da PA, assim como a hipotensão do AVC com um pior prognóstico neurológico, com maior morbidade e mortalidade, daí a necessidade de reduzí-la com parcimônia e não de forma abrupta, apenas quando houver indicação.
Sabe-se que pressões excessivamente elevadas (PAS > 220 mmHg) estão associadas a um prognóstico pior, mas a hipotensão (PAS < 60 mmHg) parece ser igualmente deletéria.

O protocolo de manejo da PA em pacientes com AVC isquêmico agudo se baseia essencialmente reduzir a PA em casos nos quais esta se encontre excessivamente elevada (PAS>220 mmHg), ou quando a redução for necessária para intituir-se o tratamento trombolítico. Nos demais casos a redução da PA não é recomendada.

A gravidade das sequelas dependem de quanto tempo demorou para o paciente ser atendido, sendo que quanto mais rápido o tratamento apropriado comece menos sequelas o paciente provavelmente sofrerá.

Reabilitação e evolução

O processo de reabilitação pode ser longo, dependendo das características do próprio AVC, da região afetada, da rapidez com que se tenha instituído o tratamento inicial do suporte que o doente tiver durante e após a internação.

Após o AVC, geralmente é necessário acompanhamento com fisioterapeuta, fonoaudiólogo e/ou terapeuta ocupacional para fortalecer os músculos que ainda possuem a inervação funcionante, na tentativa de diminuir as deficiências que possam ter sido causadas, dentre outros objetivos.

Vale lembrar que o AVC é uma doença que merece muita atenção pela mudança que pode provocar na dinâmica da vida do paciente, da sua família e das pessoas que dele cuidam. O paciente, antes totalmente funcional, pode se tornar totalmente dependente física e financeiramente de seus cuidadores. Pode, uma vez acamado, apresentar outras complicações, como escaras de decúbito, pneumonia e constipação intestinal. Além disso, existe o descrito “stress do cuidador” – que, aliás, também deve ser acompanhado e ouvido em relação à lida diária com o paciente acamado, minimizando os problemas familiares advindos.

A melhor maneira de lidar com o AVC é preveni-lo controlando todos os fatores causais já citados, novamente mencionando que a principal é a hipertensão arterial sistêmica.

Tratamento psicológico

O AVC geralmente causa um impacto significativo na vida funcional, cognitiva e social do paciente, sendo comum que o paciente desenvolva transtornos psicológicos após o evento vascular. Entre 10 e 34% deles desenvolvem depressão maior, agravando ainda mais o prejuízo funcional, cognitivo e social do paciente. Quanto maior o prejuízo na qualidade de vida e dificuldade de adesão ao tratamento mais importante é o acompanhamento psicológico e até mesmo psiquiátrico para a reabilitação do paciente.

Tratamento dietoterápico

Algumas mudanças nos hábitos alimentares podem ser necessárias durante a recuperação:

• Regularizar os horários das refeições para que se possa aumentar o fracionamento.
• É recomendado realizar refeições pequenas e frequentes, de 6 a 8 refeições por dia, sendo elas: café da manhã, lanche da manhã, almoço, lanche da tarde, jantar e ceia;
• Comer devagar;
• Selecionar uma grande variedade de alimentos;
• Os alimentos devem ser bem cozidos e muitas vezes pode ser necessário que sejam servidos em consistência pastosa na forma de papas, purês, cremes e mingaus;
• Usar caldo de carne e molhos para umedecer carnes e legumes.
• Evitar a ingestão de líquidos durante as refeições, a fim de evitar a sensação de plenitude gástrica;
• Beber bastante líquido no intervalo das refeições, ao longo do dia;
• Pode haver necessidade de adicionar espessante aos líquidos para deglutição mais segura;
• Aumentar a ingestão de frutas, sendo que estas devem muitas vezes ser servidas amassadas para facilitar a deglutição;
• Dar preferência ao leite e derivados desnatados;
• Evitar alimentos gordurosos, ingestão de alimentos fonte de gordura saturada e trans como carne vermelha, frituras e queijos amarelos;
• A última refeição do dia deve ser realizada cerca de 3 horas antes de deitar;
• Evitar roupas apertadas, especialmente após as refeições.

Prevenção

Como todas as doenças vasculares, o melhor a fazer para evitar o AVC é identificar e tratar os fatores de risco como a hipertensão arterial, aterosclerose, diabetes mellitus, colesterol elevado; interromper o tabagismo e o uso de bebidas alcoólicas, além de reconhecer e tratar problemas cardíacos. A essa prática se dá o nome de prevenção primária.

Quando o AVC acontece, os mesmos fatores devem ser controlados, principalmente aqueles que levaram ao evento vascular. A esta prática se dá o nome de prevenção secundária.

Caso ocorram sequelas, deve ser iniciado um programa de reabilitação e cuidados com o paciente que inclui equipe multidisciplinar, ou seja, com vários profissionais de diferentes áreas da saúde – fisioterapia, fonoaudiologia, psicologia, técnicos em enfermagem, enfermeiros e médicos.